A Carta

"De repente, estou só. Dentro do parque, dentro do bairro, dentro da cidade, dentro do estado, dentro do país, dentro do continente, dentro do hemisfério, do planeta, do sistema solar, da galáxia — dentro do universo, eu estou só. De repente. Com a mesma intensidade estou em mim. Dentro de mim e ao mesmo tempo de outras coisas, numa sequência infinita que poderia me fazer sentir grão de areia. Mas estar dentro de mim é muito vasto." 
Caio Fernando Abreu 

Vi sua carta sobre a mesa e afortunadamente feliz corri para ver o que você tinha a dizer, concentrava minha euforia na esperança de ler palavras de paz, conforto, saudade, felicidade. E como eu sonhei com essa carta, a tal que me tiraria de um rio de lágrimas e mostraria que ainda existe infinitos sorrisos involuntários, aqueles de canto de boca que você nem sente sair. 
Então peguei a carta na mão, respirei fundo, segurei a tremedeira e abri. 
Olhei o conjunto de palavras, o risco da tinta no papel, criei coragem e li a primeira frase... 
“Existe um frenesi quando estou com você.” 
Mãos imóveis, aquela tremedeira na perna de tanto nervoso para, por alguns segundos perco totalmente a audição, começo a mergulhar em cada palavra, deixo aflorar cada sentimento e meus olhos seguem nadando pelas linhas... 
Palavras doces. 
Atitudes. 
Pessoas. 
Sorrisos. 
Pedidos. 
E...Como? Acho que não entendi essa parte, volta! 
E depois de ler algumas mil vezes eu percebi que todo aquele desejo, carinho, saudade...não passava de uma segunda opção, a escapatória da rotina, mudança de habito talvez. 
Novamente eu voltei ao velho ponto da introspecção e vi quantas vezes eu fui a segunda opção de alguém. 
Ok, melhor abrir os olhos. Já prometi milhões de vezes não olhar fixamente o passado. Ele hipnotiza. 
Eu estava precisando de alguém sim, mas nada de longos romances, beijos suaves e amor de verão. Eu necessitava apenas de alguém, sem segundas e quartas intenções, alguém que não teria o menor problema de passar um tempo me decifrando enquanto eu estivesse olhando as estrelas, alguém pra rir sem motivo, andar por ai sem rumo, um amigo, uma companhia. 
A história da carta tão esperada se resumiu em decepção, não se tornou nada além de apatia e tristeza. E quanta tristeza por perder alguém que se quis tão perto, tão certo.

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